ELOHIM
Vozes das Ruas: A Arte Visual como uma Linguagem Urbana
Atizay: Você pode nos contar um pouco sobre você e como começou no mundo da arte urbana?
Elohim: Sou natural de Luanda, cidade capital de Angola. Posso falar que sou autodidata. Pinto já desde cedo. Comecei a pintar com meu irmão quando tinha, provavelmente, uns 13 ou 14 anos, eu não tenho bem em memória a idade, mas comecei muito cedo, porque eu me lembro que quando saía da escola, saía com meu irmão para poder ter já aquela experiência ou adquirir já aquela noção sobre a pintura. Porque a minha família é de artistas, todos nós pintamos. O meu pai também foi artista, porque ele já é falecido. Ele dizia que a arte é a nossa herança. Então, nós nos dedicamos, damos tudo aquilo que nós aprendemos para a arte, para evoluir, para prosperar nesse trabalho que nós temos. Então, desde aí, o gosto pela arte sempre houve, porque eu já admirava meus irmãos, o que eles faziam, como eles pintavam, e isso me impressionava sempre. E, com o tempo, já tinha algumas noções sobre o trabalho. E ali, posso falar que quando comecei a fazer o médio, conheci também um outro artista. Naquela época eu já não morava com os pais, eu não morava com a minha mãe. Eu morava com a minha mãe há bom tempo. Depois, fui morar na minha irmã mais velha, que é do outro lado da cidade, porque eu tinha que fazer a conclusão do meu ensino lá. E depois de lá, como era na capital, a minha vida toda, de ir da casa para na escola, sempre me encontrava com algo que identificasse a arte. Encontrava esculturas, murais, essas coisas todas. Sempre me impressionou. Mas havia um certo dia, não me lembro mais, eu sei que foi dia que começou tudo, e aí mesmo onde nasceu a minha trajetória como artista. Aí já começou a nascer o próprio Elohim, a fazer a sua trajetória. Então, ali eu vi uma obra, trabalho de um artista, que até hoje me inspiro nele, que foi a pessoa que desde aquela época, posso falar até nos anos de 2021, 2022. E olhei pelo trabalho dele, eu gostei muito, muito mesmo. Eu fui indo procurando ele quando fazia parte das exposições, quando havia atividades de pintura, essas coisas todas. E depois, encontrei alguém que conhecia o artista e me apresentou ele. E lhe disse que gostaria de aprender com ele, porque o que ele fazia era a arte urbana. Eu pintava em murais, grafites, essas coisas todas. E eu já era bom apreciador de grafite. Fazia com aquela curiosidade de copiar. Era mais copiar, ver o que os outros faziam, depois reproduzir.
A.: O que inspira suas obras de arte?
E.: Eu me lembro que na época de 2010, 2011, lá na minha mãe, eu já fazia grafitis nas comunidades, porque lá na minha mãe, eu cresci num bairro que tinha muita delinquência e os grupos de lá [me] convidavam. Eles querem ter essa possibilidade de serem em vista. Isso é como tem essa coragem, e essas coisas me encantam. E aí fui indo descobrindo mais coisas e todas as comunidades que eu ia pintar, me encontrava com jovens, falavam da sua comunidade, o que eles tinham de acesso, o que eles não tinham de acesso.
E eu frequentei bairros e bairros, que eu nunca cheguei lá, a arte que me levou até lá para poder conhecer esse tipo de pessoas. E aí por isso que eu pinto muito figura, pinto muito série, pinto muitas pessoas. E todas essas pessoas que eu pinto, por trás tem uma história, por trás tem um incentivo, por trás tem uma mudança. E é com isso que eu vou indo transformando também a mente de outras pessoas que vejam que em determinado sítio não há soluções, em determinado sítio não tem como investir. Então, há muita coisa perdida que é necessário resgatar. E nos resgatamos todos através da arte, porque a arte é comunicativa. A arte resgata.
Por mim, a arte tem um falar silencioso. E aí eu gosto disso. E o artista que eu trabalhei com ele, ele pintava muito preto e branco, cinza, os rostos. E aí também me adaptei nesse método de pintar cinza. Mas depois eu criei um discurso meu, posso falar como se fosse uma identidade minha de preto e branco. Esses tons representam as experiências de alegria e tristeza, os altos e baixos da vida. Os tons de cinza, incluindo o preto e o branco, simbolizam a amargura, os desafios e, de certa forma, uma vida sem cor. Eles também representam as pessoas anônimas cujas histórias e objetivos eu retrato por meio da pintura, sem necessariamente conhecê-las pessoalmente. Já os acessórios e complementos coloridos representam a luz, as coisas boas que recebemos ou criamos.
A.: Você chegou ao Brasil recentemente. Como tem sido sua experiência até agora na cena artística? Há paralelos ou semelhanças que você pode traçar entre os espaços artísticos que você navegou no Brasil e em Angola?
E.: Estou aqui no Brasil há dois meses. Primeiramente, quando eu cheguei aqui no Brasil, vim a convite de um festival, o Festival de Arte Urbana de Grafite, que foi em Pelotas. E participei daquela atividade e logo quando eu cheguei, me lembro bem que nos primeiros dias, já era tudo conversar a partir de lá. E quando eu cheguei aqui, recebi mais outro convite de fazer parte de uma exposição coletiva de um grande artista que eu conheci, o Fábio de Roa, do projeto Avant Graff, e aí participei. E também participei do Art Battle, já era uma coisa que eu já insistia e queria saber quais são os procedimentos para poder participar de lá de Angola, e quando eu cheguei aqui, foi uma honra participar.
Agora, generalizando, em termos da arte Angola e Brasil, eu falo que a arte urbana em Angola ainda está no princípio, está em uma fase crescente, mas está já em uma fase boa porque já temos muitos artistas mas só que está a faltar mais interação, mais atividades, mais investimento, mais pessoas que acreditam, mais pessoas que apoiam para que tudo isso possa crescer. E tomarmos também lugares, noutros patamares da arte no mundo, porque isso é nosso objetivo. Então essas oportunidades são bem-vindas para todo tipo de artista, para internacionalizar, e também o nome do país, também vai mais além, e o grafite em Angola também. Já que no Brasil é tudo evoluído, há pessoas com um olhar diferente da arte, há pessoas que têm uma linguagem muito diferente sobre a arte, no nosso ramo da arte urbana, que já há compradores, já há pessoas que se familiarizaram com esse tema ou com esse tipo de trabalho, e facilita divulgar mais, avançar mais os teus trabalhos. O Brasil é um país que está muito acima em questão de arte urbana.
A.: Qual mensagem você espera que os espectadores levem ao ver suas obras?
E.: O meu objetivo também é internacionalizar o meu trabalho aqui, fazer parcerias, trabalhar também, fazer parte de projetos, estar aberto para todos os projetos que têm a ver com a arte, palestras, aulas de pintura. Também sou professor, se for em questão desses ramos de poder ensinar. E é tudo isso que vamos indo trabalhando.
Eu sei que o processo é demorado, é difícil, mas estamos aqui a insistir. O objetivo é não parar, é não ficar no caminho. Temos que idealizar, sempre aqui no princípio tudo é difícil. Não tem nada que possa nos surpreender, porque o difícil faz parte do processo. Depois, as coisas vão indo prosperando, as portas vão indo se abrindo.
Eu sei que ainda [tem que] fazer muita coisa aqui, e já agora agradecer a este projeto maravilhoso, a esta empresa que é a Atizay - não sei se disse certo. E agradecer pelo convite de fazer parte. Então, essa é minha história, essa é minha trajetória, esse é o meu método de pintura. Espero que gostem. Fica também alguns trabalhos que serão compartilhados lá na própria página e estamos aqui. Nós estamos juntos.
Confira o trabalho de Elohim abaixo!
Obras apresentadas em ordem: Africa Power (2024), Eu Só Mulher (2024), Faz Música (2024), Notas e Percebes (2024), Olhar da Mulher (2024).